Exposição "Artistas do vestir: uma costura dos afetos"
Exhibition
- Nome: Exposição "Artistas do vestir: uma costura dos afetos"
- Abertura: 27 de novembro 2024
- Visitação: até 23 de fevereiro 2025
Local
- Venue: Itaú Cultural
- Online Event: No
- Endereço: Avenida Paulista, número 149. Bairro Bela Vista. São Paulo
Artistas do vestir: uma costura dos afetos, no Itaú Cultural, aborda as formas de pensar e fazer a moda brasileira a partir da pluralidade
Trata-se de uma exposição de moda que expande essa linguagem para uma diversidade de suportes e temas, pensando no segmento de maneira plural, como arte, política e forma de ser e estar no mundo.
Das 19h30 de 27 de novembro de 2024 a 23 de fevereiro de 2025, a exposição Artistas do vestir: uma costura dos afetos permanece aberta ao público. Ela se estende pelos três andares do espaço expositivo do Itaú Cultural (IC) para abrigar mais de 80 peças de mais de 70 artistas – 10 delas comissionadas, sendo quatro criadas exclusivamente para a mostra e seis exibidas pela primeira vez para o público brasileiro (veja mais abaixo). Em sinergia com a mostra, o núcleo de Criação e Plataformas programou mostra de filmes na Itaú Cultural Play e o Encontros IC Play, abordando essa temática.
Com concepção e realização da equipe do IC e curadoria de Carol Barreto e Hanayrá Negreiros, a mostra perpassa grupos diversos do pensar e fazer moda brasileira. Cada um dos pisos é batizado por um tema – Ancestralidades, Contemporaneidades e Fazeres Contínuos –, mas todos se conectam e dialogam sem hierarquias ou cronologia.
“Essa mostra abrange muito das temáticas que atravessam outros projetos e programações do Itaú Cultural, nas artes visuais e em outras linguagens: o processo de criação, a ancestralidade, o contemporâneo e a memória”, diz Sofia Fan, gerente de Artes Visuais e Acervos do Itaú Cultural. “É um espaço que propõe ver a moda como instrumento de arte, de política e forma de ser e estar no mundo”, conclui ela.
“A moda é o assunto principal da exposição, mas não é só. Pensamos no tema como linguagem expandida em diversos suportes artísticos de maneira plural e diversa”, diz Hanayrá. “Não temos pretensão de dar conta de todo o assunto, mas queremos colocar o debate de como a moda é, por um lado, esse ambiente que nos proporciona uma sensação de afetividade e, por outro, uma maneira crítica de pensar problemas estruturais que existem no Brasil”, completa.
Para Carol, a mostra procura visibilizar e construir essa ponte com o trabalho de pessoas que não são vistas como fazedoras de moda, mas que sustentam o saber fazer nesse campo. “O debate central da exposição é a intelectualidade manual, que alicerça o campo da moda e é espaço de exploração. São costureiras, bordadeiras, pessoas que interpretam nossos croquis para modelagem, dentre outras. Nós dependemos delas”, completa.
Ancestralidades
Este eixo, ou núcleo de famílias artísticas, como as curadoras nomeiam, está no piso 1. Ele tem foco em obras e artistas que trabalham com temáticas e grupos ancestrais, em um amplo leque de nomes, como as Bordadeiras do Curtume do Vale do Jequitinhonha, Angela Brito, Ekedy Sinha, Fernanda Yamamoto e Lino Villaventura. É por aqui que passa boa parte dos afetos e das memórias propostas pelas curadoras.
Este andar apresenta, por exemplo, a indumentária original de Rainha de Nossa Senhora das Mercês, usada pela poeta, ensaísta, dramaturga e professora Leda Maria Martins no Reinado de Nossa Senhora do Rosário do Jatobá, em Minas Gerais. Vale citar, aqui, que a última mostra da série Ocupação Itaú Cultural, neste ano, será dedicada a ela, onde haverá uma réplica tátil da vestimenta que ela usa nessas ocasiões.
Ainda neste espaço, o público encontra outros trajes de respeito ancestral e memorial. Um deles é Asò Orisà, obra comissionada em reedição de Ekedy Sinha, do Terreiro da Casa Branca, a primeira casa de candomblé do Brasil, situada em Salvador na Bahia. Trata-se da roupa de Iyalorixá na nação Ketu (sacerdotisa de matriz africana de origem Iorubá) usada por uma mãe de santo, uma das mais importantes expressões de religiosidade no candomblé. Feita em tecido branco com bordados em richelieu, a peça reflete a estética ancestral do Terreiro da Casa Branca, do qual a artista é integrante.
Respeitosamente, ela divide espaço no andar com Oxalá usa ekodidé – Cortejo Afro, peça do também baiano Alberto Pitta inspirada em Oxalá (Oxalufã ou Oxalá). Ela foi confeccionada em 2022 como indumentária do Bloco de Carnaval, que nasceu na comunidade do Ilê Axé Oyá, idealizado pelo artista plástico há mais de 40 anos e onde se desenvolvem trabalhos ligados à estética e cultura africana.
A maior obra deste piso, também comissionada e em reedição, é de Goya Lopes e se estende do térreo para este andar. São três tecidos de 7m x 1,4m cada um – Dia e Noite; Tecendo o destino e Teares, todos de 2022. O propósito da designer e artista, que completa 50 anos de carreira em 2024, sempre foi divulgar a cultura afro-brasileira com arte na moda e em um movimento de brasilidade, introduzindo a temática da ancestralidade por uma ótica de conhecimento e autoconhecimento.
Ao lado de trabalhos de Lino Villaventura e de Fernanda Yamamoto – esta em parceria com a Comunidade Yuba –, encontra-se Connection, obra confeccionada pela gaúcha Anne Anicet, uma das artistas comissionadas na mostra, e seu Atelier Contextura especialmente para a exposição. O seu trabalho remete à necessidade de reconstrução de sua cidade e estado, que, neste ano, passaram pela maior catástrofe ambiental de suas histórias. A peça apresentada é inspirada nas árvores, que, quando são abraçadas, garantem conexão com a natureza.
De Karlla Girotto (SP), também inédita e comissionada, tem A terra é a pele da Terra. Aqui, a artista faz peças pintadas com a terra da cidade de Igatu na Chapada Diamantina, na Bahia, e inspiradas na prática da bisavó de recolher as meias rasgadas da família para rechear almofadas e edredons. Ainda navegando pela memória, a baiana Juliana Fonseca criou Corpo vazio para a mostra. Trata-se de uma peça, de acordo com ela, nascida de questionamentos dos corpos, como forma de comunicar e sentir o corpo preenchido, construída com cordas, fios de seda e barro da cidade de Maragogipinho no Recôncavo Baiano.
Só para citar mais algumas obras presentes nesse piso, tem Cerrado Kalunga e Capa Boiadeiro protegido, da goiana Naya Violeta, criadora de moda afrocentrada. Sua marca, homônima, foi a primeira de uma goiana a estar no São Paulo Fashion Week (SPFW). Ela se inspira nas cores e movimentos das celebrações da Folia de Reis, uma tradição familiar que moldou o seu olhar para uma moda enraizada em afetos e ancestralidade. A obra se divide em duas partes: uma bandeira, que estabelece conexão entre dois territórios quilombolas, e a reconstrução da capa de boiadeiro em náilon corta-vento e algodão, com bordado de cerâmica e pedras miúdas.
Nascida na periferia de São Luis do Maranhão e trabalhando desde 2015 com a fotografia e suas ramificações, Silvana Mendes exibe Frestas III. Segundo ela, o conceito que dá nome à obra vem das imagens clássicas cheias de brechas históricas, que, se ressignificadas com a presença negra, criticam a hegemonia visual eurocêntrica e criam imaginários.
Neste andar, o público encontra uma projeção de Rosana Paulino revelando o seu trabalho têxtil e manual. Da paraense Irekran Kaiapó, mulher indígena idosa, integrante da comunidade da aldeia kubêkrãkej, da cultura mênbêgôkré, tem uma série de adereços confeccionados com o conhecimento cultural transmitido para ela por sua mãe, tias e avós: a saia Mêjn kradjê, a pulseira Mê ýnay kam ágâ, o bracelete Mepádjê, o adorno Áyn, o colar Meôkrédjê, a tornozeleira Prýn-ká e o adereço de antebraço Meyn-ý ou Meýnaý kam pýn ká.
Contemporaneidades
No piso -1, os trabalhos expostos sob o título contemporaneidades abordam temas atuais, discussões diretamente ligadas a questões políticas, de gênero, raciais e performáticas, em uma mescla de nomes mais conhecidos da esfera da moda brasileira com outros independentes e alternativos – entre eles, Alexandre Herchcovitch, Dudu Bertholini, Rita Comparato, Fause Haten, Rober Dognani, Jal Vieira, João Pimenta, Lab Fantasma, Sioduhi e Vicenta Perrota.
Neste andar, se encontra uma obra realizada a partir de pesquisa feita em Inteligência Artificial para ajudar a construir a coreografia de uma África nunca colonizada. Chama-se Poéticas Agenders AfroFuturistas e é do mineiro Fábio Costa da marca NotEqual. Ele viveu 12 anos em Nova Iorque, onde estudou, trabalhou, foi finalista em um reality show, atuou em grandes casas de moda e em um ateliê que produz figurinos para espetáculos da Broadway. Foi um dos estilistas destacados na última semana de moda de Nova York.
Memória é resistência: Sertão é dentro da gente é o trabalho apresentado por Dayana Molina, da Nalimo, criadora dos povos Aymara e Fulni-ô, e reconhecida no meio da moda. De 2024, essa obra integra a coleção Capibaribe – da cidade ao sertão e remete à origem de pessoas indígenas do sertão pernambucano. Ela é composta de selos, que simbolizam o trânsito entre capitais, como Recife, Rio de Janeiro e São Paulo.
Nascido na comunidade indígena Mariwá, às margens do Uaupés, afluente do Rio Negro, no Amazonas, Sioduhi apresenta Ovos de cobra, de 2023. O artista conta que, por meio da moda, espalha as histórias que ouviu quando era criança. A peça aqui apresentada foi desenvolvida em São Gabriel da Cachoeira (AM) com a Associação das Artesãs Indígenas (Assai), formada por mais de 15 mulheres. É um vestido feito com aplicação de novelos de tucum e tingido naturalmente, com corante têxtil à base de mandioca. Por sua vez, Viga é mais uma obra comissionada e inédita, fruto de uma pesquisa de Jal Vieira sobre o afrossurrealismo, com uma experimentação de técnicas, formas disformes e materiais que provocam uma visão mais ampliada sobre o conceito de objetos vestíveis feitos por mulheres negras.
Do paulistano Fause Haten tem Máscara branca, entre outras, feita por ele em 2016 a partir de uma camisa do desfile Marrocos, de 2007, que estava guardada no seu acervo. Liberta do armário, ela virou uma nova obra, que se sobrepôs à obra inicial em uma nova camada. O designer e artista apresenta na mostra um conjunto de três peças que delineiam um trânsito entre moda e arte por meio da reinterpretação de suas peças de acervo e a criação de obras inéditas. Os trabalhos de Haten refletem sua atuação na história da moda brasileira, mas também pensa sua atuação como artista visual
Objeto modular vestível SULANCA foi confeccionada por Jorge Feitosa, em 2021. A obra, fruto de uma ação coletiva ocorrida em uma oficina, é constituída de módulos em formato de almofadas, com aplicação de zíperes destacáveis nas bordas, o que possibilita diferentes configurações de uma (possível) peça – objeto modular vestível – a partir da variação das conexões propostas. Cada participante da oficina confeccionou, com retalhos e sobras de tecido, um desses módulos.
Vittor Sinistra traz uma reflexão sobre o conceito de loucura para as suas criações, como se vê em Veneno, de 2024. O artista trabalhou na área de saúde mental do Sistema Único de Saúde (SUS) e o trabalho com moda e arte o ajudou a processar as experiências com saúde mental que ainda ecoam em sua cabeça e se traduzem em peças e desfiles performáticos que ampliam os limites de gênero, sexualidade e raça.
Estandarte explosão, peça de Leandro Castro, de 2023, foi realizada a partir de processos híbridos de modelagem bi e tridimensional, interpretando a anatomia física de explosões e foi confeccionada com a utilização de resíduos têxteis automotivos.
Fazeres Contínuos
Por fim, o piso -2 remete aos fazeres, desenhos e costuras contínuos de um ateliê de moda. É, também, um espaço para acolher performances, esculturas têxteis e oficinas, que serão organizadas pela equipe de educativa de mediação cultural e relacionamento do Itaú Cultural.
Chama a atenção a peça Lembrança 1984, de 200 x 200 cm confeccionada pelo pernambucano Ellias Kaleb e reeditada para esta exposição em comissionamento do IC. Trata-se de um vestido-instalação no qual estão impressas as cartas trocadas por seus pais quando namoravam, em 1980, antes de seu nascimento – ambos eram pernambucanos, mas o pai morava em Rio Formoso e a mãe em Serra Talhada. Segundo o artista, esta é uma maneira de dar forma aos sentimentos por meio da costura.
Pardo é Papel: primeiro contato é uma peça de 2020, confeccionada por Maxwell Alexandre com dimensões e técnicas variadas, como acrílica, betume, caneta esferográfica, carvão, fita crepe, grafite, graxa e pastel seco sobre papel pardo. Fruto de sua residência artística no Al Maaden Museum of Contemporary African Art (MACAAL), em Marrakech, trata-se de uma instalação que ocupou três partes do museu na exposição coletiva Have You Seen A Horizon Lately? Ela é composta por mais de 30 desenhos em papel pardo, representando pessoas negras e jovens em recortes com formato de moldes de roupa e agora vista pela primeira vez no Brasil.
Neste andar, também tem uma escultura vestível de Jum Nakao, que demonstra o processo de confecção da modelagem, do manequim até o papel. Com a proposta de ampliar o acesso ao seu trabalho e compromisso com o saber-fazer na área da modelagem, Jum vai disponibilizar cópias do molde para o público, em uma prática de estímulo aos Fazeres Contínuos que caracterizam este piso.
Para citar mais uma, entre as diversas peças deste piso, Corpus – Reciclar e vestir é assinada pela baiana Cllaudia Soares, que se dedica às manualidades artesanais, às artes visuais, à academia e às tecnologias digitais. As peças surgiram de resíduos de sacolas plásticas que seriam descartadas como lixo, e, após tratamento, se transformaram em tecido para a criação de roupas. Ela é inédita e é a única que está na categoria site specific.
Por fim, o piso conta com uma projeção audiovisual produzida pela própria equipe do Itaú Cultural. O vídeo – de cerca de 10 minutos – apresenta imagens que enfatizam o valor da manualidade nos processos dentro dos ateliês. Com duas telas de 75 polegadas, a narrativa dá ênfase à delicadeza dos processos e às texturas das matérias-primas. As imagens foram gravadas nos ateliês de Alexandre Heberte, Cllaudia Soares, Dayana Molina, Ekedy Sinha, Ellias Kaleb, Fernanda Yamamoto, Goya Lopes, Heloisa Strobel, Juliana Fonseca e Jum Nakao.
Programação paralela
Ainda, a Itaú Cultural Play, plataforma gratuita de streaming do cinema brasileiro, tem programação em sinergia com a mostra e passa a disponibilizar filmes que dialogam com a moda e o vestir, a partir do dia da abertura. São eles: Ôrí, filme de Raquel Gerber, com narração da historiadora Beatriz Nascimento, realizado em 1989; Favela é moda, de Emílio Domingos, e Estou me guardando para quando o carnaval chegar, de Marcelo Gomes, ambos de 2019; O ponto firme, de Laura Artigas (2020) e A costura do invisível, vídeo com registros do icônico desfile de objetos vestíveis feitos em papel apresentado por Jum Nakao no São Paulo Fashion Week (SPFW), em 2004.
Também em sinergia com a mostra, no dia 26, é realizado o Encontros IC Play – atividade mensal voltada para a difusão e o debate sobre o audiovisual brasileiro –com o tema O figurino vestindo histórias, como ferramenta na construção de identidade do personagem. Participam da conversa Paula Iglecio, figurinista do audiovisual que já trabalhou com diretores como Fernando Meirelles, Anna Muylaert e Carlos Alberto Riccelli, e a figurinista e mestre em moda Chris Garrido, que já trabalhou na tevê, no teatro e no cinema, como no filme O Pai da Rita, do diretor Joel Zito Araújo.
Obras comissionadas, criadas especialmente para esta mostra:
Connection, de Anne Anicet | Atelier Contextura
Corpus - Reciclar e vestir, de Cllaudia Soares
Viga, de Jal Vieira
A terra é a pele da Terra, de Karlla Girotto
Comissionadas reeditadas – editadas a partir de uma obra já existente
Asò Orisà , de Ekedy Sinha | Terreiro da Casa Branca
Lembrança 1984, de Ellias Kaleb
Dia e noite, de Goya Lopes
Corpo vazio, de Juliana Fonseca
Cerrado Kalunga e Capa Boiadeiro protegido, de Naya Violeta
Frestas III, de Silvana Mendes
DATA
De 27 de novembro a 23 de fevereiro
LOCAL
Presencial - Itaú Cultural
Address
Avenida Paulista, número 149. Bairro Bela Vista. São Paulo/SP